segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Não chora, amor!


Não chora, amor, que também choro
Gotas de impotência e de dor.
Não chora assim baixinho, imploro!
Não chora assim!! não chora amor!

Na angústia do teu triste choro,
O céu escurece em teu favor;
Nublam feições que tanto adoro;
Borra o meu mundo já sem cor.

Na vida, amor, nada é perfeito,
Nos perdemos na insana roda
Que esmaga qualquer coração

E sangra o já sofrido peito.
Contudo, o que mais me incomoda
São tuas lágrimas indo ao chão.


quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Homo sapiens


Sou aquele que não tem cor,
Nem branco, vermelho, nem preto,
Não passo de um mero projeto
Divino, ou obcuro, ou o que for.

Sou um inútil pecador,
Sou resquícios de um roto feto,
Sou um mal guardado, secreto,
Criatura feita sem amor.

Sou um ser sem pátria e sem lar,
Um que não merece um lugar,
Um verme desterrado, um fardo.

Sou aquele que não tem nada,
O da dignidade roubada,
A besta!... a fera!... sou pardo.


quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Devolva-me a mim


Devolva, por favor, o olhar que te lancei
Na primeira vez em que te vi, minha flor.
Devolva o brilho de minh'alma porque sei
Que minha vida em outro olho é sem sabor.

Devolve os beijos que te dei com todo o ardor,
Encarecido, rogo só o que é meu por lei
E que roubaste enquanto me tomou de amor
E os sonhos que, acobardado, te entreguei.

Vê que tudo que te dei é tão obsoleto
Sem o calor do meu corpo langue, fremente
E sem os dolorosos suspiros de afeto...

Por mil razões suplico a ti humildemente:
Devolve as estrelas do meu céu! que prometo
Te dar de volta tudo em dobro novamente.

À terra fria


Quem, sob o céu, quer viver deste jeito?
Um mês faz hoje, amor, que não te vejo;
Anos luz me separam do meu peito;
Guardo um ranço insuportável no beijo.

Nesta cruel redoma, um ar rarefeito,
Sem dó, esmaga meu pulmão, pois pelejo
Transpor Barreiras que têm contrafeito
O cerne do meu mais puro desejo.

Queria ter-te aqui por um vago instante
Pelo menos... Eu que sempre ceifei
Cada mínima lágrima em tua face

Revolta, contorcida e ofegante;
Desejo os lábios que tanto beijei
Antes que a fria terra a mim abrace.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Simplesmente... Bela



Minhas palavras totalmente atadas
Repousam cá num canto duro e frio
Ao olhar teu corpo belo e esguio
Serpentear com tuas feições de fadas.

Ah! Meu coração bate a machadadas
No insólito devaneio que fio,
Mas, se ris, não contenho e também rio
Enquanto o peito explode em gargalhadas.

Nublam-se completamente os pensares
Por todos os movimentos incertos,
E os pudores se esvaindo nos ares;

Teu sotaque pôe ouvidos despertos;
E em todos os lugares que passares
Deixarás, sempre, a todos boquiabertos.


Lua minguante



Quando tu, Lua minha, chegaste a mim
Co'a luz opaca roubada de outrem,
Pensando-se iluminada, mas sem
Saber que, ali, fora escrito o teu fim.

Zuniram nos céus trombeta e clarim,
Arcanjos se derramaram em desdém,
Quando louvores e quereres-bem
Lograste do mais puro querubim.

Chorou também o guerreiro mais forte
Ao deparar-se com a tua triste morte
E com o vazio que cá no céu deixaste...

Mas a alvorada encheu-se dum clarão
N'olho, um brilho trouxe gran comoção...
Quando em um novo Sol te transformaste.


Braille



Hoje leio novamente o soneto
No livro do teu belo corpo escrito;
Às vezes sussurro, às vezes grito,
Quando na catarse do teu ser me meto.

Absorto em teu enredo quedo quieto,
Atônito qual leitor neófito.
No fim, aos prantos, duas vezes repito
A aliteração do último terceto.

Nos versos, me deleito em linhas curvas,
Leio-te em Braille, com as pontas dos dedos
Tateantes nas páginas gris e turvas.

Leio-te totalmente, frente e verso;
Fico tão faminto dos teus segredos
Que recomeço do primeiro verso.


terça-feira, 19 de outubro de 2010

Penosos ais


Hoje sou metade do que era antes;
Uma nuvem ofusca o clarão do riso,
Rio apenas porque rir é preciso,
Mas me afogo em soluços sufocantes.

No peito, penosos ais incessantes
Ecoam no chão magmático em que piso.
Aos prantos, um insano riso, impreciso
Deforma minhas feições já minguantes.

Sobrevivo choroso pelos cantos
Escuros, buracos-negros da vida.
Anseio a paz melódica dos cantos,

Acalantos de uma lira esquecida.
Me observa, por uma fresta, aos prantos,
A felicidade... há tanto perdida.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Os beijos que te dei


Os beijos que te dei me consumiram;
Queimaram-me o lábio antes gelado,
Deixando a sensação, quando partiram,
De nunca, em vida, haver outrem beijado.

Os beijos que te dei a mim despiram;
Teu ardor me largou petrificado.
Hoje, troço meu, meus olhos suspiram
Por qualquer chance de estar ao teu lado.

Em ti, qual gelo ao fogo derreti.
Pois eu, sem forças p’ra fugir de ti,
Liquefiz-me ao toque da tua palma.

Porém, musa de caprichos letais,
Não furtaste de mim somente os “ais”,
Usurpaste pedaços da minh’alma.

domingo, 12 de setembro de 2010

Qual anjo dormias


No escuro do quarto, enquanto dormias,
Penso se é real este sonho lindo
E, em meus tolos devaneiros, me findo
Esperançoso que dure mais dias.

Tua silhueta faz quente as noites frias;
perdida em ti minha mente vai indo,
E me percebo como bobo rindo
Que, qual anjo, ao meu lado tu jazias.

Penso se desta feita será tarde;
sem ti?! só em pensar meu rosto já arde;
Te ter agora ainda me é consolo.

Miro teu rosto e, de novo, rio,
pois só me larga este torpe vazio
se, na penúmbra, recosto em teu colo.

sábado, 7 de agosto de 2010

Os beijos que não te dei


Os beijos que não te dei me consomem,
Legando um gosto amargo à minha boca,
E a saliva estanque que me sufoca
Rouba o viço da minha tez de homem.

Os beijos que não te dei, em mim somem
Como se a alma que eu tinha fora oca
E, olhando para o imenso vácuo, invoca
A ver, todos, as dores que a carcomem.

Dos beijos que não dei meus lábios secam,
Inerte, o coração já não acelera,
Mendigando lembranças sobrevive.

Meus olhos, em se fecharem, já pecam.
Sobretudo, há uma dor que dilacera:
Falta um pedaço meu que nunca tive.

domingo, 4 de julho de 2010

O filho morto



Arrasta mulher, tua cria ao teu colo;
Derrama esta chuva negra em teu olho;
Molha a fronte do teu langue pimpolho;
Atira ao inferno qualquer consolo.

Espanta a morte por tamanho dolo;
Tange esta bilontra... Este trambolho
Que ceifa pueris almas molho a molho
E, Cruel, reclama tão amargo imolo.

Grita mulher, pois o abutre a rodeia;
Gane, grune, rosna, morde, golpeia;
Execra a odiosa encarnação de Caim.

Mesmo que, em teu vão desespero violento,
Prema com toda força o teu rebento.
Vê que é de ti levado mesmo assim.


sexta-feira, 23 de abril de 2010

Dissabor


Sinto um grande ressentimento
Quando passas, minha flor,
Com o andar de bambu ao vento,
Despertando por um momento
Na minh’alva face o rubor.

É enorme acontecimento
Quando o teu quadril transgressor
Sem o menor acanhamento
Arranca um suspiro, um lamento,
Ilude um pobre sonhador.

Enquanto eu, coitado, olho atento,
Irrompo num grave clamor,
Pois rogo por merecimento,
Até um ar galante invento,
Dos olhares lanço o melhor.

Contudo teu ser pirracento,
Travestida em puro frescor,
Com um toque de acanhamento,
Sangra o estanque ferimento
Co’um sorriso perturbador.

Dói... e me contorço em tormento,
E dói sem ao menos ser dor;
De dentro pra fora arrebento;
Ao lado ouço um corvo agourento
E me derramo em dissabor.


quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Solidão II


Deusa austera de poder infinito;
Algoz dos vãos sonhos da raça humana;
Medusa amedrontadora e insana;
Escopo de um terror nunca antes dito.

Tua presença desperta angústia lhana
E dói nos ossos o teu frio maldito,
Enquanto definha o dom mais bonito
Aos gritos teu próprio nome ufana.

Mas não te inquietes, ó Deusa do só,
Mesmo que julguem de ti o pior,
Que te olhem sempre com tanto temor,

Há ainda uns poucos renegados
Que pela convivência maltratados
Transformam teu frio seio em calor.