quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

O Beijo


E vem ela, e cobre a minha boca com lábios em brasa. de repente sou jogado n’uma outra dimensão, e as coisas mais simples, minúsculas, tomam formas gigantescas; cada contorno dos seus lábios são pomos de frutas adocicadas prontos para serem colhidos; cada inspiração é como se – egoísta – roubasse todo o ar dos meus pulmões; e ponho-me em desespero e busco umas migalhas de oxigênio dos restos que me deixa. Torno então a explorar cada ponto da sua boca como se fosse a última vez, e cada vez parece a última, e morro de medo de me afastar e não mais sentí-la. Mordisco com muito cuidado seu lábio inferior, por um instante esqueço de todo o resto e, percebendo a grande injustiça com o restante daquele prodígio da natureza em forma de boca, volto e envolvo-a por completo na tentativa inútil de desculpar-me. A língua!? Ah! A língua, exemplo de perfeição na forma. Músculo que parece prolongar-se do próprio coração, criança traquina que me despe a boca, que descobre meus segredos e por vezes ri ao ver-me enrubescido, sem graça e totalmente entregue aos seus jogos juvenis.
Ah! Menina, se tu soubesses quão perigoso é o teu mel, que como veneno arrasa todas as defesas que se tente, em vão, impor-te; que como soro da verdade expõe os mais longínquos confins de minh’alma.
Seu hálito boreal congela meu sangue, petrifica meus músculos e renova todo o ar que aspiro e que necessito; doce brisa que me faz sentir flutuando por entre as nuvens, envolvido em uma fina camada de água, prestes a derreter-se em chuva. Porém, quando mais me seguro é quando com a língua, convidas minha alma a seguir-te e, não tendo êxito, tenta suga-la à força. Grande desespero é imaginar meu corpo sem o dom divino dado pela respiração do próprio deus. Aí... descola sua boca da minha e, eu agora só metade, ponho-me, saudoso, a lembrar do sonho que acabara de ter.

Senhor?



Em meio ao chiqueiro fétido de sangue coagulado
Pereço, embora lute com o peito cortado.
Entrego-me à fadiga, ao senhor da guerra.
Entre espinhosa grade meu sisudo ser s'encerra.

Um clamor abraça aquele bravo senhor guerreiro,
Sua pilhagem humana amontanhada no terreiro.
Mas, n'uma noite escura d'estéricos gritos.
A correria d'homens, mulheres, crianças aflitos.

A chuva mistura-se com o sangue daquela chacina.
Defendendo seu povo daquela irada carnificina,
O grande guerreiro luta de peito exposto.

Por fim, no primeiro raio de sol d'alvorada,
Olhou-me no olho com as mãos também atadas;
Vi uma lágrima escorrer-lhe do áspero rosto.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Mula


Lá ela vai pastando desajeitada,
Tentando impor um mínimo respeito.
Se, mal em pé se sustenta direito,
Como pode majestade ser chamada?

Esbraveja ao menor som que aproxima;
Bufa, relincha, distribui coices,
Devasta tudo ao redor como foices
Devastam a vegetação da campina.

Acha-se esperto demais para pensar
E, de tão esperto, pensa tudo saber.
Porém, quando precisa mais raciocinar

Se enrola e acaba em dizer
Tudo aquilo que não deveria falar.
Dá coice até em quem vem defender.


Às portas do paraíso


No grande azul de nuvens brancas mil
Mergulho o ser meu alvo, puro e são.
Dois anjos róseos param ao portão,
Se riem um sorriso juvenil.

E no meu vôo neste céu de anil,
Ao longe, alegre sacudia a mão
E repeti o gesto assim, em vão.
Olhou... sorriu... e fez que não me viu.

Pensava já em ter com o criador,
Pois inocente então me percebi.
Barrado!!! Da pureza minha cri:
"Engano deve ser meu bom senhor."

"Engano algum!" foi dito neste instante.
"É que não traz em si ouro bastante."

Louco por vida


Aai!!!
Ai meu deus!!
Meu deus!! ... ??...
Ai meu deus!
acho que tô ficando louco
Ai meu deus!
é só o que ouço.

Tem alguém que não pára de fazer silêncio no meu ouvido.
dizendo coisas que sempre fazem sentido.
e Grita desvairadamente, para o desvario da minha mente:
Ai meu deus!?
acho que tô ficando louco.
Aai meu deus!!!!
e ele grita mais um pouco.

Eis cá o vazio...


Eis cá o vazio...
inerte, mudo dormente,
tudo que cá existe
são sombras,
enormes sombras,
vestígios de uma vida,
sobras de uma semente.
eis cá o vazio...

Toco e não sinto o toque,
riu um sorriso desdentado,
olho e nada vejo,
grito mas não escuto,
amar e não ser amado.

Neste planeta azul
de grandes montanhas
e enormes construções,
gente correndo, crianças chorando.
eis cá o vazio...

Fugir não adianta,
enfrentá-lo tampouco.
resta a sorte de um dia
cá neste inerte vazio
aquele velho vento vadio
volte a soprar de novo.
eis que eis cá o vazio...
vazio, vazio...
vazio...